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Flor Cadáver curated by Ana Cristina Cachola at Galeria Foco





Flor Cadáver curated by Ana Cristina Cachola at Galeria Foco



A FLOWER, FOR LOVE

When the eye lands upon a virtuous ceramic work by Francisco Trêpa, we promptly
believe it does not belong to this world; yet, we have no doubts that it belongs to
another - it contains an ontology of belonging that intrigues us like a kind of magnetic
field. Therefore, we cannot stop looking at it, we let it seduce us and then we want to
follow it, to know where it comes from. In "Flor-Cadáver," Trêpa's first solo exhibition,
this magnetic field will lead us to encounter deep affections, inquiries, and
autofictions.
In a more extensive exploration of pollinators and their importance in the survival of
planetary life, Francisco Trêpa discovers the Rafflesia: it is a genus of leafless parasitic
plant, known for producing the world's largest flower. The Rafflesia is native to
Southeast Asia, especially Indonesia, and its flower emits a strong and unpleasant
odor, similar to that of a decomposing body, which attracts pollinating insects like flies
and beetles. In other words, it often pretends to be dead. This pretense of the titular
protagonist, which punctuates various moments of the exhibition, spreads throughout
the rest of the scenery. Trêpa's multitude of pollinators are arranged in specific
narratives, more or less dramatic (feigned?). They are all there in this exhibition
universe to remind us of their existence and appeal for survival.
Pollinators occupy a place of crucial importance in the survival of the human species
and planet Earth. Due to habitat loss, pesticide use, climate change, diseases, and
parasites, many are on the brink of extinction, with all that entails. It is no different in
Trêpa's pollinator universe, where both the keeper and the killer emerge – the
ambiguity of the human being as guardian or murderer of these creatures. Trêpa's
hands, gestures, and body can inform us but also shape us (we will certainly become
more attentive). Drones are added to the pollinators, which replace them in turn. The
drone insinuates itself, however, in a less direct manner, through inscriptions,
decorations, and repetitions of minimal objects. The scenes we witness ensure the
narrative axis of the exhibition, but they do not unveil all the narratives. We will not
know the future of these beings.
In Francisco Trêpa's works, there is always a dynamic relationship with matter (and the
materials he uses), and in several cases, the plastic and imagetic suggestions do not
serve as a substitution for the material world, not being a sign for something else, but
rather they hold the power to create "tropes" of new universes and their imaginaries.
Trêpa's work thus summons various "tropes" — nature, landscape, plants, flowers,
dreams, the oneiric, the possibilities of figuration, the (de)construction of places, the
unpredictability of matter, just to mention a few —, which are placed in a state of
suspension, seeming that each of his pieces is in a constant metamorphic and
performative condition, so that, even when materially static, they show themselves
endowed with consequent movement. In this sense, Trêpa's artistic practice lacks a
monolithic and crystallized ontology, because, despite the constancy, there are
multiple reverberations and suggestions in the viewer's gaze.

April 2024
Ana Cristina Cachola


UMA FLOR, POR AMOR

Quando o olho pára sobre uma virtuosa obra de cerâmica de Francisco Trêpa cremos
prontamente que ela não pertence a este mundo; todavia não temos dúvidas de que
pertence a um outro - contém uma ontologia de pertença que nos intriga como uma
espécie de campo magnético. Por isso, não paramos de olhá-la, deixamos que nos
seduza e depois queremos segui-la, para sabermos de onde vem. Em Flor-Cadáver, a
primeira exposição individual de Trêpa, esse campo magnético levar-nos-á a encontrar
profundos afetos, inquirições e autoficções
Numa pesquisa mais extensa sobre polinizadores e a sua importância na sobrevivência
da vida planetária, Francisco Trêpa descobre a Rafflesia: trata-se de um género de
planta parasita sem folhas, conhecida por produzir a maior flor do mundo. A Rafflesia é
nativa do sudeste da Ásia, especialmente da Indonésia, e a respetiva flor emana um
forte e desagradável odor, semelhante ao de um corpo em decomposição, o que atrai
insetos polinizadores como moscas e besouros. Noutras palavras, finge-se de morta
frequentemente. Este fingimento da protagonista titular, que pontua diversos
momentos da exposição, propaga-se pelo restante cenário. Os vários polinizadores de
Trêpa dispõem-se em narrativas específicas, mais ou menos dramáticas (fingidas?).
Todos estão ali neste universo-exposição para relembrar a sua existência e apelar à
sobrevivência.
Os polinizadores ocupam um lugar de capital importância na sobrevivência da espécie
humana e do planeta Terra. Devido a perdas de habitat, uso de pesticidas, mudanças
climáticas, doenças, e parasitas e espécies invasoras, muitos encontram-se em vias de
extinção, com tudo o que isso acarreta. Não é diferente no universo dos polinizadores
de Trêpa, onde surgem representados tanto o keeper quanto o killer – a ambiguidade
do ser humano enquanto guardião ou assassino destes bichinhos. As mãos, os gestos, o
corpo de Trêpa conseguem informar-nos mas também formar-nos (ficaremos
certamente mais atentos). Aos polinizadores junta drones, que os substituem. O drone
insinua-se, contudo, de forma menos direta, através de inscrições, decorações e
repetições de objetos mínimos. As cenas a que assistimos garantem o eixo narrativo da
exposição, mas não desvendam todas as narrativas. Não saberemos o futuro destes
seres.

Reconhece-se sempre, nas obras de Francisco Trêpa, uma relação dinâmica com a
matéria (e materiais que usa) e, em vários casos, as sugestões plásticas e imagéticas não
desempenham uma função de substituição do mundo material, não sendo um signo
para uma outra coisa, mas antes detêm o poder de criar «tropos» de novos universos e
os seus imaginários. A obra de Trêpa convoca, assim, diversos «tropos» — a natureza, a
paisagem, as plantas, as flores, o sonho, o onírico, as possibilidades da figuração, a
(des)construção de lugares, a imprevisibilidade da matéria, apenas para mencionar
alguns —, que coloca num estado de suspensão, parecendo que cada uma das suas
peças se encontra numa condição metamórfica e performática constante, sendo que,
mesmo quando materialmente estáticas, se mostram dotadas de movimento
consequente. Neste sentido, do fazer artístico de Trêpa está ausente uma ontologia
monolítica e cristalizada, pois, apesar da constância, são múltiplas as reverberações e
sugestões no olhar do espectador.
O artista identifica o respetivo campo de pesquisa como sci-fi barroco, uma linhagem
que articula elementos dessa estética ornamentada com temas e conceitos da ficção
científica. Em Flor-Cadáver é explorada a complexidade da realidade e o colapso do
pensamento binário, a fusão entre o orgânico e o tecnológico (muito evidente no caso
dos drones polinizadores). Narrativas complexas, visualmente ricas e cheias de carga
simbólica, compõem a matriz de trabalho de Trêpa: o amor, o gesto e o pensamento.
Esta exposição não tem fim, tem apenas um destino: o abraço, a necessidade universal
de conexão e empatia, transcendendo diferenças em espécie ou origem.

Abril de 2024,
Ana Cristina Cachola



"Francisco Trêpa usa a escultura como suporte para a imaginação", at Jornal Público - Ípsilon by Luísa Soares de Oliveira 


https://www.publico.pt/2024/04/30/culturaipsilon/noticia/francisco-trepa-usa-escultura-suporte-imaginacao-2088529

"Sobre Flor Cadáver, de Francisco Trêpa" at Umbigo magazine by Maria Inês Mendes


https://umbigomagazine.com/pt/blog/2024/05/02/sobre-flor-cadaver-de-francisco-trepa/